quarta-feira, 26 de junho de 2013

O Poder da Arte

A arte no filme Le fabuleux destin d'Amélie Poulain

Não é lá uma novidade muito grande o fato de que eu sou extremamente controversa diante de uma infinidade de coisas. Por exemplo, eu tenho muito medo de filmes de terror e não os assisto nem sob tortura, protesto, se for preciso, mas não os vejo sob circunstância alguma. Porém a maioria das minhas séries favoritas possuem contextos perturbadores e estão classificadas no gênero terror/horror/suspense. E parece que sempre sou atraída por esse tipo de assunto, tenho curiosidades e adoro falar sobre assuntos como espiritismo em conversas, gosto de contar e ouvir casos e essas tais lendas urbanas. Mas ao mesmo tempo eu odeio tudo isso, tenho pavor e não gosto de pensar nas hipóteses dessas coisas todas se provarem reais.

E outro dia eu acabei encontrando ao acaso uma artista ilustradora que possui esse estilo perturbador em todas suas obras e eu fiquei absolutamente fascinada. Fiquei fascinada pelo puro simbolismo de suas obras, fiquei fascinada pela forma simples e ao mesmo tempo complexa do seu trabalho. Não me aprofundei em pesquisas sobre ela, não até esse momento em que resolvi fazer essa postagem. Mas a coisa toda agrava a minha personalidade contraditória, pois os temas das obras dessa artista são realmente fortes, alguns até um pouco repulsivos, daqueles que nos causam as mais variadas sensações, as mais desconhecidas, as que dão medo, mas ao mesmo tempo fascinam. Eu sou apaixonada por qualquer coisa que brinque com o psicológico, então para mim, arte - nesse ponto, abstendo-se apenas na arte visual, tais como pinturas ou esculturas - é a forma mais metafórica de todas, é onde se pode examinar a maior parte de uma personalidade e todas as suas controvérsias, os seus medos, os seus desejos íntimos. Talvez seja por esse motivo, mais do que qualquer outro, que as mesmas coisas que me aterrorizam sejam, de certa forma, também as que mais chamam a minha atenção, pois gosto muito de desafiar a minha mente e seus limites.

Já não é de hoje que esse tipo de obra me atrai, porém até hoje nunca tinha visto nada que se comparasse ao trabalho dessa artista de que tanto falo. Meu pai há vários anos chegou em casa com um livro sobre o pintor Hieronymus Bosch e pra muita gente suas obras não são belas, mas eu tenho uma tendência a ver beleza no que chega a beirar o bizarro. Bosch é mais conhecido por destacar em suas obras atos de pecado e até mesmo representações do próprio inferno como pura carnificina, cenas tortuosas e muito sadismo. E essas imagens realmente chegam a perturbar a mente, utilizando o estilo fantástico e também o sombrio, ao mesmo tempo. Há abuso de cores concentrador apenas em certos pontos das obras, o que se torna deveras cansativo para os olhos e para o cérebro. Eu, particularmente, vejo estas obras com infinita admiração, por repassar um sentimento tão forte - ou vários deles. E arte para mim é isso, é repassar sentimentos. É bem mais fácil através da escrita, mas através da pintura, do desenho, das cores fortes e mesmo da ausência delas, isso não é nem perto do que é simples. Tocar a alma de uma pessoa no silêncio e brincar com seus sentidos, seus medos mais íntimos e causar esse desconforto prazeroso é muito mais difícil. Livros podem causar isso, mas o impacto é gradativo, como doses homeopáticas de uma tortura necessária, ao observar um desenho, uma pintura ou até mesmo uma escultura, o choque é quase fatal, a energia que é descarregada através do cérebro e que vai percorrendo todo o seu corpo é muito intensa, todos os níveis são elevados e não estão mais sob o seu controle, seus sentidos passam a pertencer ao autor da obra, estando ele morto ou vivo, pelo menos naquele um instante, e enquanto dura o efeito do choque é ele quem possui o controle total sobre a sua mente e sua alma. E é isso que me fascina sobre a arte, que me coloca em êxtase.

Detalhe central da tela O Jardim das Delícias de Bosch em 1504
 
Peço que reserve um pequeno tempo para clicar na imagem e apenas observar a obra detalhe por detalhe da obra. Tome isso como um desafio, permita-se entrar na obra e experienciar um pouco do sentimento de transe que tanto falo.
Bosch foi uma obsessão que eu criei quando mais nova, mas nunca tinha procurado nada semelhante. Devo confessar que nos meus anos de adolescência, a vontade era sempre maior do que o incentivo de fazer as coisas e a preguiça sempre me vencia, então eu acabava me acomodando à limitação de informações que recebia ao acaso, mas não procurava me aprofundar. Eu acho que não adianta mais lamentar sobre estes fatos, porque ninguém nunca quer saber sobre algo quando está fadado a estudar e ler sobre aquilo, mas de uma hora para outra o assunto se torna realmente interessante quando não é mais uma obrigação e sim por puro prazer de saber mais sobre determinada coisa. Eu costumava pensar que tinha perdido muito tempo, tempo esse que eu jamais iria conseguir recuperar, de fato, a gente não recupera o tempo, mas atualmente eu venho percebendo que mesmo com o tempo que perdemos, ainda assim sempre estamos em tempo de recuperar velhos hábitos que nos beneficiavam, de recuperar velhas dúvidas e ir atrás de suas respostas e sempre, sempre é o momento certo para adquirir mais conhecimento sobre o que for.

Aleksandra Waliszewska
E foi ao acaso mesmo que me deparei com essa artista que venho querendo falar sobre, que é a polonesa Aleksandra Waliszewska. Eu usei aqui algumas de suas obras para ilustrar alguns dos meus textos. O seu trabalho me remete à pesadelos e memórias ruins, mas também me remete à estados de espírito variados e nem sempre ruins, lugares imaginários e fora do alcance da realidade, lugares secretos da mente, esconderijos pessoais. É como se pudéssemos entrar em contato com nossos próprios medos, mas ao mesmo tempo enfrentá-los, como nos pesadelos, onde temos que lutar para viver. A minha contraditória pessoal faz com que eu me sinta hipnotizada por esse tipo de arte, é complexo, é pra ser visto com os olhos, porém sentido com a alma. É arte pra se perder dentro dela.

A artista em si, ao que me parece, não é uma pessoa muito pública, o que chega a ser irônico, pois ela revela a sua alma em seu íntimo mais obscuro, mas são pouquíssimas as informações encontradas sobre a moça, ela também não fala muito sobre suas obras, recusa-se a defini-las e esse é um dos pontos mais incríveis sobre ela, pois assim, ela nos permite expandir ainda mais a mente diante de suas criações. Eu quando observo uma obra, tenho lembranças de coisas que talvez não vivi, mas sei que são lembranças, tenho vários flashes, tenho também memórias que vivi e há muito já havia esquecido, sinto coisas que já senti antes e coisas que nem sabia que poderia sentir. Me sinto parte da obra, me coloco dentro dela. Quando você vê uma pintura e sabe o que ela significa, a sua viagem pela mesma se torna limitada, você sabe que aquilo que interpreta é pessoal, mas também sabe que não compartilha dos mesmos sentimentos que o autor da obra, você não se sente íntimo e a obra passa a ser apenas um agrado de leve aos olhos. Mas as obras cobertas de mistério agradam e também agridem, sentimos como se estivéssemos sendo despidos pelo artista e caminhamos nus dentro da sua criação, não temos certeza de que o que sentimentos talvez não tenha sua parcela de realidade. Nesse caso, tudo é possibilidade. Tudo é sim e não ao mesmo tempo.

Aleksandra Waliszewska é uma incógnita, mas ao mesmo tempo, é um livro aberto. Eu sempre pensei sobre artistas - nesse caso, agora, envolvendo a arte como um todo, pintores, escritores, escultores, atores, músicos - e por qual motivo eles são considerados ídolos. Quando eu era mais nova, via inspirações de vida em todos os meus artistas favoritos, porque gostava de suas músicas ou porque gostava de algum filme que faziam, mas essa é a parte superficial e sem valor, não é o que os define como pessoa, não é o individual de cada um deles. Não durou muito tempo para que eu começasse a me interessar pela história dos artistas e, logo, filtrar meus ídolos como indivíduos avulsos, pessoas como eu e não pessoas acima de mim. Um ídolo ou uma inspiração, da forma que eu vejo hoje, é aquela pessoa que você gostaria de passar um tempo conversando ou que gostaria de seguir os mesmos passos, são pessoas que conquistaram o seu lugar no mundo e oferecem algo que, ultimamente para mim, tem sido essencial buscar em qualquer fonte que me garanta isso: esperança de alcançar algo melhor. Ídolos são pessoas que você desejava ter o coração tão grande quanto, são pessoas que aprimoram a sua capacidade de sentir alguma coisa. Hoje tento focar as minhas frustrações no fato de que, com um pouco de esforço, posso sair de onde estou, posso mudar a minha história. E meus ídolos tem parte nisso, me mostrando que isso é possível. Mas mais do que isso, vejo eles pelo trabalho que fazem, o legado ao qual eles dedicam suas vidas, hoje prefiro dizer que sou muito mais inspirada pela arte produzida por alguém do que pela pessoa em si, salvas algumas exceções.

A arte tem um poder infinito sobre a minha persona. Quando estou a olhar para uma ilustração confusa, estou na verdade tentando me colocar ali dentro e fazer parte daquilo que vejo. Quando estou escrevendo, estou tentando me posicionar no mundo como alguém que compartilha algo que considera útil para si e que pode também ser útil para mais alguém. Hoje vejo que, se pelo menos uma pessoa apreciar o que eu faço e souber me reconhecer, eu já estou fazendo valer à pena os tapas que eu levo da vida. Se eu sou capaz de inspirar algo em alguém, é certo que vou tentar fazer isso. Quando escrevo minhas crônicas abstratas, estou deixando pra trás pedacinhos de mim mesma, derrubando-os pelo meu caminho. A arte está nos pequenos detalhes, é o impacto que ela causa tem proporções gigantes nas vidas de quem recebe a sua arte. É uma pena eu não saber pintar ou desenhar majestosamente, mas acredito que também estou deixando algo importante quando me expresso com as palavras. Toda arte é arte e merece ser apreciada.

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Sugiro que tire um tempo apenas para observar um pouco da obra da Aleksandra Waliszewska. Permita que sua imaginação tome lugar na obra, permita que seus sentimentos se misturem aos sentimentos contidos na imagem:

 
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THE CAPSULE 
 
Filme que, infelizmente, não tive a oportunidade de ver ainda, 
pois não o encontro em lugar algum.


TRAILER:


IMAGENS:

  
   
   

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